quarta-feira, 27 de abril de 2016

A INVASÃO DOS LED

Meu texto no último "As Letras entre as Artes"



O Ano Internacional da Luz só terminará no dia 21 de Junho, data do solstício de Verão, na Casa da Música do Porto. Continuemos pois a falar de luz. 


Desde Thomas Edison que conhecemos e usamos lâmpadas eléctricas. Se anos antes se tinha conseguido produzir em grande escala energia eléctrica, a verdade é que só com o inventor norte-americano começámos a ter luz eléctrica em nossas casas e nas ruas, em substituição progressiva mas muito rápida da antiga luz química, resultante de uma forma ou outra de combustão e bastante mais perigosa e cara.  A primeira lâmpada incandescente com capacidade comercial foi construída por Edison em 1879 (curiosamente o ano em que Einstein nasceu). O seu filamento era de carbono, mas Edison depressa percebeu que este material era facilmente perecível, vindo a ser substituído pelo tungsténio. A  evolução das tecnologias é ilustrada pelo facto de hoje praticamente já não existirem lâmpadas de tunsténio. Estas foram sendo substituídas, nos tempos mais recentes, por lâmpadas compactas fluorescentes e por lâmpadas LED, as iniciais das palavras Light Emitting Diode. As lâmpadas de tungsténio passaram a ser proibidas nos Estados Unidos em 2014 por questões ambientais: o seu rendimento é muito mais baixo do que o das lâmpadas  de de tungsténio, obrigando a maior consumo de energia eléctrica e, portanto, a maiores emissões de gases de efeito estufa. As lâmpadas fluorescentes compactas (criadas pelo inventor norte-americano Peter Hewitt em 1901) usam apenas um quinto a um terço da energia eléctrica do que as lâmpadas de tungsténio (isto é, dão cinco a três vezes mais luz para a mesma potência eléctrica), e duram cerca de dez vezes mais. A desexcitação dos electrões de átomos de mercúrio, contidos num tubo sujeito a uma descarga eléctrica, origina luz ultravioleta, e uma cobertura de material fosforado, converte-a, por fluoerscência, em luz visível. Essas lâmpadas têm o inconveniente de  usarem mercúrio, o que obriga a separação quando são deitadas ao lixo.

 

Toda a tecnologia tem o seu tempo. Cada vez mais cresce o uso, em vez de lâmpadas fluorescentes de mercúrio, das lâmpadas LED. Podem ser vinte vezes mais eficientes do que as lâmpadas de incandescência e não apenas cinco vezes como as lâmpadas fluorescentes. Por outro lado, as lâmpadas LED duram bastante mais do que as outras: o seu tempo de vida é cerca de cem vezes maior do que o das lâmpadas de incandescência e não apenas cerca de dez vezes. É, sem dúvida, um grande avanço!

 

Foi longa a chegada até aos LED actuais. A investigação dos primeiros LED deveu-se a um russo obscuro, Oleg Osev, que viveu no tempo dos sovietes. Apesar de não ter uma educação formal e de não ter passado de um técnico,  criou o primeiro LED (de cor verde e muito pouco eficiente) em 1927. Osev chegou a escrever a Einstein, sem ter obtido resposta, dizendo-lhe que o efeito presernte no díodo (uma junção de um material semicondutor que fornece electrões com outro que os recebe) era uma espécie de efeito fotoeléctrico, que Einstein tinha descrito em 1905, mas ao contrário: Se no efeito fotoeléctrico os electrões de um metal são arrancados pela luz ultravioleta, no díodo luminescente a luz visível é emitida a  partir de uma corrente eléctrica, que não precisa de ser muito intensa. Mas Osev não conseguiu dar uma explicação teórica. Morreu, provavelmente de fome como tantos outras vítimas, em Lenigegrado em 1942. 


Demorou muito a perceber o fenómeno e a encontrar as suas aplicações. Só no fim da guerra, mais precisamente, em 1951, um trabalho na Physical Review, numa revista científica de topo norte-americana, aparecia uma explicação do fenómeno com base na mecânica quântica. Na região de contacto, sob a acção do campo eléctrico, ocorre um rearranjo dos electrões, saltando os que estão em níveis energéticos elevados para níveis mais baixos. Estes saltos dão-se com emissão de luz, cuja cor depende do “tamanho” do salto. Nalguns materiais, a luz  pode mesmo ser ultravioleta e  infravermelha (“cores” que estão para lá das cores que o nosso olho vê). Foram várias as empresas norte-americanas que desenvolveram a tecnologia, formecendo nos anos 60 LED vermelhos que serviam para monitorizar dispositivos eléctricos e electrónicos.

 

Foram os japoneses que deram um grande salto em frente no início dos anos 90, com o desenvolvimento de LED que emitiam luz azul. A Academia de Ciências de Estocolmo atribuiu o Prémio Nobel da Física de 2014 a três cientistas japoneses: Isamu Akasaki e Hiroshi Amano, da Universidade de Nagóia, no Japão, e Shuji Nakamura, actualmente na Universidade de Califórnia - Santa Barbara, pela “invenção de eficientes díodos emissores de luz azuis, que permitiram a criação de luzes brancas brilhantes e economizadoras de energia.” Com semicondutores adequados, os japoneses produziram não só díodos de cor  azul  mas também de luz ultravioleta: quer num caso quer noutro, tal como nas lâmpadas de mercúrio, uma cobertura de fósforo permite emitir luz branca, de algum modo semelhante à luz que provém da nossa estrela, mas com uma importante diferença: a luz LED é fria, isto é, a luminescência não produz aquecimento, o que explica a grande eficácia da tecnologia.

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Vivemos num mundo cada vez mais iluminado por lâmpadas LED. Temos LED em nossas casas (de habitação, de escritório ou de comércio) e nas nossas ruas. Para aumentar a luminosidade, colocam-se várias lâmpadas LED pequenas no espaço correspondente a uma única lâmpada antiga. Também já são usados LED em ecrãs de televisão. Aquilo a que se chama normalmente ecrãs LED são, de facto, cristais líquidos com iluminação LED traseira, mas já começaram a aparecer ecrãs LED que dispensam os cristais líquidos. O jogo de futebol da final da Taça dos Campeões de 2011, entre o Manchester United e o Barcelona, foi exibido na cidade de Gotenburgo na Suécia numa grande ecrã LED, que permitia visão tridimensional com o auxílio de óculos.


A viagem em direcção ao admirável mundo novo não acabou. Hoje fabricam-se OLED, onde o O de Organic. Os LEDs de materiais orgânicos, permitem lâmpadas flexíveis, mais apropriadas para ecrãs. Esta nova transformação dos LED mostra mais uma vez o enorme poder que a ciência, através da tecnologia, exerce nas nossas vidas.

Carlos Fiolhais*

*Coordenador Nacional de 2015 - Ano Internacional da Luz (tcarlos@uc.pt)

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