terça-feira, 23 de dezembro de 2014

UMA "AVALIAÇÃO" ROCAMBOLESCA


A ciência em Portugal está a ser humilhada por um pequeno grupo que se apropriou dos cofres públicos em favor dos seus interesses particulares. Eis as declarações que prestei hoje ao jornal Público sobre a "avaliação" rocambolesca da Fundação para a Ciência e Tecnologia / European Science Foundation (FCT/ESF):
"Para Carlos Fiolhais, o rol de incongruências que o processo sofreu desde o início mancha o resultado final. “Em ciência, uma experiência quando é mal planeada e mal conduzida só pode dar maus resultados. Foi o que aconteceu com a pseudo-avaliação da FCT. Nuno Crato devia na ciência, tal como na  educação, abandonar os experimentalismos”, disse ao PÚBLICO o físico da Universidade de Coimbra, que tem sido muito crítico deste processo de avaliação.  
O financiamento estratégico que cada centro obteve também é visto com desconfiança por Carlos Fiolhais: “É uma coisa opaca, mal explicada e nalguns casos inexplicável. Parece arbitrária, o que não admira, dada a fragilidade do processo.”
Ler o resto da peça do Público aqui. [faltava a palavra mal no último parágrafo]

Os resultados ora anunciados podiam facilmente ser previstos. Se o objectivo desta "experiência" por parte dos que a conduziram era afundar o sistema científico português, eliminando metade das unidades de investigação logo à partida e depois escolhendo uma mão cheia delas de um modo obscuro, pode dizer-se que ele foi até agora alcançado. De facto, havia fins políticos por detrás de toda uma aparência de avaliação científica, como mostram as elevadas somas atribuídas a todos os centros ligados aos actuais ocupantes do poder político (com a excepção do centro do próprio ministro, que recebe uma quantia ridícula, o que significa simplesmente que Nuno Crato não volta para lá, tendo abandonado de vez a ciência). Com o anúncio da FCT nas vésperas de Natal, numa conferência de imprensa onde a entidade externa, a ESF, não deu sequer a cara (deu-a na primeira fase, numa sessão pública),  acabou por cair a confiança nos actuais responsáveis, que já estava extremamente minada. Para lá das graves irregularidades processuais que eles cometeram em todo este inacreditável simulacro de avaliação, sobre as quais os tribunais terão em última instância de decidir (mais de uma centena de centros protestou na primeira fase, que decorreu sem visitas de avaliadores, isto é, sem assegurar condições de igualdade com os outros), está à vista  o atropelamento dos mais elementares princípios de rigor científico, que a comunidade científica não deixará de julgar. Muitos "avaliadores" não eram sequer especialistas nas áreas que estavam a avaliar, em clara violação do decreto-lei que rege a avaliação.  Não houve, portanto, avaliação por pares, mas sim por um reduzido número de  indivíduos escolhidos sabe-se lá com que critérios por uma instituição europeia sem experiência na matéria nem suficiente credibilidade.

A avaliação é um pilar de qualquer sistema científico. Os cientistas portugueses querem ser avaliados de uma forma séria, honesta e transparente. Será pedir muito?

2 comentários:

Anónimo disse...

Inacreditável a concentração de recursos em meia dúzia de centros, à custa de dezenas de centros altamente produtivos. Com esta medida tornam-se os grandes centros ainda maiores e acaba-se com a concorrência entre centros. Até à próxima avaliação, daqui a 5 anos, qual vai ser o estímulo para estes centros ditos excepcionais melhorarem a sua produção? Este governo já acabou com os outros centros que poderiam competir para o acesso a estas verbas...agora só precisam esperar que os financiamentos futuros lhes caiam no colo. Bonito.

Anónimo disse...

Infelizmente e apesar de se ter discutido muito este tema, a mobilização tem-se ficado apenas pela discussão. A verdade é que o Ministério e Nuno Crato dão o processo como consumado, e se não se alterar a forma de protesto e repudio a esta forma de fazer avaliação, muitos centros de investigação estão de facto condenados à extinção.

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